domingo, 23 de junho de 2024

Ver Deus x Conhecer Deus, segundo Orígenes

 


8.                Essas afirmações talvez tenham menos autoridade junto daqueles que querem ser instruídos nas coisas divinas a partir das Santas Escrituras, e que nelas procuram a prova da maneira pela qual a natureza de Deus está tão acima da natureza dos corpos. Vejamos se o Apóstolo não diz a mesma coisa, quando fala de Cristo, ao dizer: “aquele que é a imagem do Deus invisível, o primeiro de toda a criação” (Cl 1,15). Isso não quer dizer, como pensam alguns, que a natureza de Deus é visível para um e invisível para os outros; com efeito, o Apóstolo não diz “a imagem do Deus invisível” para os homens, ou invisível para os pecadores, mas coloca uma afirmação absolutamente invariável acerca da natureza própria de Deus, quando diz: “imagem do Deus invisível”. E quando João, no Evangelho, diz: “Nunca ninguém viu Deus” (Jo 1,18), mostra, claramente, a todos os que são capazes de compreender, que não existe nenhuma natureza para a qual Deus seja visível; não no sentido em que seria visível por natureza, porém escapasse da vista da criatura, ultrapassando-a, por causa da fraqueza desta, mas porque, pela sua natureza, não pode ser visto. Se me perguntam o que penso a respeito do próprio unigênito, e se eu disser que também para ele a natureza de Deus não é visível, ela que é invisível por natureza, não se deve logo considerar essa opinião como ímpia ou absurda, e vamos oferecer uma explicação coerente. Ver é uma coisa, conhecer é outra; ser visto e ver é coisa própria dos corpos, ser conhecido e conhecer é da natureza intelectual; assim, tudo o que é próprio dos corpos não deve ser pensado a respeito do Pai e do Filho; mas o que pertence à natureza da divindade é o que está presente nas relações entre o Pai e o Filho. O Evangelho não diz: “Ninguém viu o Pai a não ser o Filho e ninguém viu o Filho a não ser o Pai”, mas disse: “Ninguém conhece o Filho a não ser o Pai, nem o Pai a não ser o Filho” (Mt 11,27). Isso indica claramente que o que, para as naturezas corporais e para as suas mútuas relações chamamos ver e ser visto, diz-se, para o Pai e o Filho, conhecer e ser conhecido, pelo poder do conhecimento e não pela fragilidade da visão. Por isso, não podemos falar propriamente de ver e ser visto a propósito da natureza incorporal e invisível, e por essa razão não se diz no Evangelho que o Pai é visto pelo Filho nem o Filho pelo Pai, mas que é conhecido.

9.                Se alguém nos pergunta por que é que se diz: “Felizes os corações puros, porque eles verão a Deus” (Mt 5,8), parece que a nossa asserção ficará assim mais firme ainda, porque “ver Deus pelo coração” não é justamente compreender e conhecer pela mente, como acabamos de expor? Muitas vezes, de fato os nomes dos membros sensíveis são relacionados com a alma; assim, se diz “ver pelos olhos do coração” (Ef 1,18), é ter a intuição de uma coisa intelectual pelo poder da inteligência. Do mesmo modo, fala-se de escutar com os ouvidos quando se percebe um sentido intelectual mais profundo. Dizemos ainda que a inteligência pode servir de dentes, quando ela mastiga e come “o pão da vida que desce do céu” (Jo 6,33-51). De modo semelhante, diz-se que ela recorre aos serviços dos outros membros, que se atribuem às faculdades da alma por uma transição da sua aplicação corporal, como diz Salomão: “Encontrarás o sentido divino” (Pr 2,5). Com efeito, ele sabia que em nós existem dois gêneros de sentido: um é o dos sentidos mortais, corruptíveis, humanos, e o outro é o dos imortais e intelectuais, o sentido que aqui chamei de “divino”. Eis, portanto, o sentido divino, não dos olhos, mas do “coração puro”, isto é, da mente, graças ao qual Deus pode ser visto por aqueles que são dignos. Podem-se encontrar em abundância em todos os escritos do Novo e do Antigo Testamento exemplos do termo coração utilizado como mente, isto é, a faculdade intelectual. Compreendendo, portanto, assim a natureza divina, de um modo sem dúvida muito inferior ao que conviria, por causa da fraqueza da inteligência humana, vejamos agora o que quer dizer o nome de Cristo.

 

(Orígenes, “Tratado sobre os Princípios”,  São Paulo: Paulus, 2012, págs. 67-69)


terça-feira, 5 de setembro de 2023

Sonhos perigosos




"As pessoas cujos sonhos foram coletados para este livro veem todo o aparato da civilização moderna sendo posto em movimento, veem como elas mesmas passam a fazer parte dele, orientando, mudando ou deformando seu próprio comportamento. Ministérios, postos alfandegários com seus vigias, escolas com seus boletins e exames, casernas, prisões, os correios ou a central de eletricidade, hospitais e delegacias, chefes e técnicos... todo esse aparato surge não apenas para facilitar ou regular o dia a dia moderno, mas também para fazer com que as pessoas percam sua integridade pessoal. Nos sonhos, mostra-se de forma angustiante como isso acontece com a ajuda das organizações nazistas. As pressões para cantar junto, saudar, falar em coro e participar... pressões às quais as pessoas tentam escapar, à medida que se subjugam a elas. Os próprios pensamentos são manipulados — adaptando-se ao teor dos ditos propagandísticos ou sendo totalmente absorvidos por ele. Todas as variantes de obrigação estão presentes aqui: deste “ter que falar” até “ter que calar-se” — e mesmo a proibição de sonhar, como última consequência do terror nesse meio que é o sonho.

O que temos aqui são sonhos de perseguidos e, sobretudo, daqueles que se adaptaram ou que queriam se adaptar e não podiam. A pessoa é isolada e, para não desmoronar, subjuga-se à pressão da conformidade, que lhe permite sobreviver às custas de sua liberdade interior. Ao se inserir no sistema do absurdo, ela se livra aparentemente de seu próprio desespero, do desdobramento de personalidade. Dessa forma, torna-se também possível sobreviver na perversão. Tudo isso é desvendado pelo sonho: ele não mostra a realidade exterior, como esta se apresenta no dia a dia, mas sim uma estrutura nela escondida. Os sonhos revelam aquelas forças propulsoras secretas e a obrigação de se adaptar a partir das quais as ondas de entusiasmo foram colocadas em movimento, carregando ou arrastando as pessoas na época. Eles apresentam ao mesmo tempo, sem piedade, uma conta fatal, que não pode ser paga. Nesse sentido, nossas testemunhas foram verdadeiramente realistas."

(Reinhart Koselleck, no posfácio do livro “Sonhos no Terceiro Reich” de Charlotte Beradt, Ed. Três Estrelas, 2017, pág. 176/177)


sexta-feira, 14 de julho de 2023

Martele! Martele!

 


"Caberia perguntar se essa insistência constante na infâmia e na inferioridade dos judeus, essa hostilidade contra eles, não tenderia a provocar um efeito atenuante e contraditório. A pergunta poderia logo ser ampliada para incluir o valor e a durabilidade de toda a propaganda de Goebbels. Poderia gerar outra dúvida: um questionamento ao pensamento nazista no campo da psicologia de massas. Mein Kampf, de Hitler, insiste em afirmar a necessidade de manter a massa na ignorância e explica claramente como intimidá-la contra qualquer reflexão. Um dos principais recursos para isso é martelar sempre, repetidamente, as mesmas teorias simplistas que não podem ser rebatidas. Quantas partes da alma do intelectual (sempre isolado) também pertencem às massas que o cercam!"

(Victor Klemperer, em “LTI – A Linguagem do Terceiro Reich”, Ed. Contraponto, 2009, pág. 280)




quarta-feira, 7 de junho de 2023

Discursos tóxicos

 


O nazismo se embrenhou na carne e no sangue das massas por meio de palavras, expressões e frases impostas pela repetição, milhares de vezes, e aceitas inconsciente e mecanicamente. Costuma-se considerar como meramente estética e inofensiva a citação de Schiller sobre von der gebildeten Sprache, die für dich dichtet und denkt [a língua culta, que poetiza e pensa por ti]. Um verso bem redigido, em uma “língua culta”, não pode ser aceito como prova suficiente da força poética do autor. Em uma língua assim, não é difícil adotar uma aura de poeta ou pensador.

Mas a língua não se contenta em poetizar e pensar por mim. Também conduz o meu sentimento, dirige a minha mente, de forma tão mais natural quanto mais eu me entregar a ela inconscientemente. O que acontece se a língua culta tiver sido constituída ou for portadora de elementos venenosos? Palavras podem ser como minúsculas doses de arsênico: são engolidas de maneira despercebida e parecem ser inofensivas; passado um tempo, o efeito do veneno se faz notar. Se, por longo tempo, alguém emprega o termo “fanático” no lugar de “heroico e virtuoso”, ele acaba acreditando que um fanático é mesmo um herói virtuoso, e que sem fanatismo não é possível ser herói. As palavras fanático e fanatismo não foram criadas pelo Terceiro Reich, mas ele lhes adulterou o sentido; em um só dia elas eram empregadas mais do que em qualquer outra época.

(Victor Klemperer, em “LTI – A Linguagem do Terceiro Reich”, Ed. Contraponto, 2009, págs. 55/56)


quinta-feira, 27 de abril de 2023

Herança e tolerância

 


Em seu livro de crônicas “O Trauma Alemão, Experiências e Reflexões 1938-2000” (Ed. Bertrand Brasil, 2007), a jornalista, escritora e historiadora austríaca de origem húngara Gitta Sereny (1921-2012) traz uma série de relatos de figuras nazistas e personalidades ligadas ao período, marcados por profundas reflexões a respeito do que o estudo dessa catástrofe continua ensinando para a humanidade.

Trata-se exatamente disso: Gitta Sereny teve a rara habilidade de examinar o seu tempo e extrair de seus entrevistados o máximo possível de verdade e humanidade ainda que diante de tanta perversidade.

Apesar de essencial, não é exatamente um livro fácil de ler.

Um capítulo é particularmente sombrio, “Os Filhos do Reich” (págs. 330/354), em que o leitor se depara com as tragédias pessoais de alguns descendentes de expoentes macabros do III Reich, como os filhos de Reinhard Heydrich e Martin Bormann.

O filho mais velho de Bormann se chamava Martin Adolf Bormann (1930-2013) e era considerado “o afilhado favorito de Hitler”.

Os rastros de seu pai se perderam na madrugada de 2 de maio de 1945, quando o secretário particular do Führer teria sido visto morto ao tentar fugir a pé do bunker de Berlim.

Seus restos mortais foram finalmente identificados mediante exame de DNA somente em 1998.

No dia em que seu pai morreu, Martin Adolf Bormann tinha 15 anos de idade e por pouco não se matou junto com 8 pessoas do grupo com o qual estava escondido.

O filho fugiu e foi criado por uma devota família austríaca, o que o fez abraçar a fé a partir de 1947, renegando o passado nazista, tornando-se padre católico em 1958 e renunciando ao sacerdócio em 1971.

No último encontro do grupo de filhos de nazistas “ilustres” monitorado por um psicólogo israelita, Dan Bar-On (1938-2008), realizado no final da década de 1980, Martin Adolf deixou seu alerta (pág. 354):

“Mas acho que temos que ficar muito atentos”, advertiu Martin Bormann. “Temos de deter absurdos onde quer que os notemos. No instante em que ouvirmos alguém dizer algo que ofenda a dignidade humana, quer isso seja contra estrangeiros, tal como ocorre muito frequentemente agora na Alemanha Ocidental, quer contra pessoas de outras crenças ou de outra cor, devemos protestar e discutir isso. Atitudes como essas jamais deverão ser ignoradas. Cerca de 50 anos atrás”, prosseguiu, “algumas pessoas iniciaram um processo de horrores, mas muitos, mesmo sabendo disso, toleraram-no. Tudo começou exatamente como agora: com pichações, piadas vulgares e troca de olhares maliciosos. Então, foram os judeus; agora, são os turcos e vietnamitas. A discriminação só será detida se aceitarmos a ideia da responsabilidade pessoal, para que não se permita jamais que isso fique sem contestação. Acho que isso é nossa obrigação sim, como pais de nossos filhos”.

quarta-feira, 1 de março de 2023

Quando até os animais se desorientam diante da perversidade humana

 


Um dos massacres (pogroms) mais perversos e emblemáticos da Segunda Guerra Mundial ocorreu na cidade de Jassy (“Iași” – se pronuncia “iáshi”), na Romênia.

Pogrom é a transliteração da palavra originada do russo погром, que se incorporou ao léxico de todos os idiomas mais falados do planeta, e que significa a perseguição violenta e deliberada de um grupo étnico ou religioso, aprovada, tolerada ou incentivada pelas autoridades locais, especialmente contra os judeus.

Sinônimo de genocídio, portanto.

A maldade alcançou magnitude tão inimaginável no pogrom de Iași que nem os animais — no caso os cachorros — conseguiram lidar com tamanho terror.

A Romênia era aliada da Alemanha nazista, e o general Ion Victor Antonescu (1882-1946), inicialmente seu primeiro-ministro desde 1940, depois ditador ("conducător", que quer dizer “condutor”), enviou as tropas romenas para se aliarem às alemãs na invasão da União Soviética lançada na madrugada de 22 de junho de 1941 e que ficou conhecida como “Operação Barbarossa”.

Houve uma resistência inicial do exército vermelho estacionado na então limítrofe república soviética da Moldávia, que bombardeou a cidade fronteiriça romena de Iași, onde havia muitos grupos fascistas e antissemitas.

A retaliação das autoridades e da população local contra os judeus foi imediata, acusando-os de serem “traidores comunistas”.

Há testemunho de sobrevivente em vídeo de que — um dia antes do início do massacre — foram distribuídos folhetos com a frase “judeu bom é judeu morto”.

Judeus sendo conduzidos à morte pelas ruas de Iași

O pogrom de Iași ocorreu entre os dias 28 de junho e 6 de julho de 1941, tornando-se um dos primeiros atos abomináveis do holocausto judeu que ceifou milhões de vidas e horrorizou o mundo.

Estima-se que dos 728 mil romenos judeus (4% do total da população) antes da guerra, pelo menos 270 mil foram exterminados naquele período tenebroso, e não só por alemães nazistas.

No pós-guerra, Antonescu foi julgado, condenado à morte e executado por fuzilamento no dia 1º de junho de 1946, por crimes como o genocídio iniciado em Iași, descrito com tintas fortes por Mark Mazower em seu livro “O Império de Hitler”:

Na véspera da Barbarossa, Antonescu encontrou-se outra vez com Hitler, e pouco depois organizou unidades especiais para instigar a limpeza étnica na região norte do país. Em particular, deu instruções específicas ao Exército e ao Ministério do Interior para organizar a “evacuação” de 45 mil judeus na cidade fronteiriça de Jassy, e as preparações, baseadas em eventos semelhantes mas de menor escala do ano anterior, logo foram concluídas. As portas das casas dos cristãos na cidade foram marcadas com uma cruz para ser diferenciadas, e espalharam-se rumores intencionais de que paraquedistas soviéticos haviam pousado na cidade. Quando o pogrom eclodiu, na noite de 28 para 29 de junho, soldados, policiais, guardas e centenas de civis invadiram as ruas, arrombando casas e levando os moradores presos para o quartel-general da polícia. Muitos judeus forma atacados e mortos no local, mulheres foram estupradas. Mais de mil foram fuzilados no interior do quartel-general da polícia quando os alemães abriram fogo a esmo. Alguns dos sobreviventes foram espancados e torturados antes de ser tangidos para vagões sem ventilação, excedendo a capacidade em três vezes, entre corpos vivos e mortos. Enquanto o trem transportava lentamente sua carga humana pelas planícies no calor do verão, mais de 2700 morreram de desidratação, com os corpos sendo jogados em plataformas de estações ou nos campos. Ao todo, entre 13 mil e 15 mil pessoas morreram.

O jornalista italiano Curzio Malaparte, que por acaso estava em visita a Jassy na época, acordou na manhã seguinte:

Fui até a janela e olhei para a rua Lapusneanu. Espalhados por ali havia corpos humanos em estranhas posições. Os bueiros estavam cobertos de cadáveres amontoados uns sobre os outros. Centenas de corpos estavam jogados no pátio da igreja. Bandos de cães rodeavam, ressabiados, farejando os mortos à procura de seus donos; pareciam cheios de pena e respeito; moviam-se em torno daqueles pobres cadáveres com delicadeza, como se não quisessem pisar naqueles rostos sanguinolentos ou naquelas mãos rígidas. Equipes de judeus, vigiados por soldados e policiais armados de metralhadoras, faziam o trabalho de por os corpos para um dos lados, abrindo o meio da estrada e empilhando os cadáveres ao longo das paredes para liberar o tráfego. Caminhões alemães e romenos carregados de corpos continuavam partindo. Uma criança morta estava sentada na calçada perto da lustrageria, as costas apoiadas na parede e a cabeça caída no ombro [...] A estrada estava atulhada de gente — hordas de soldados e policiais, grupos de homens e mulheres e bandos de ciganos de cabelos longos e anelados conversavam entre si divertida e ruidosamente enquanto pilhavam os mortos, erguendo-os, rolando-os, virando-os de lado para tirar seus casacos, calças e roupas de baixo; pés eram prensados sobre barrigas mortas para ajudar a arrancar os sapatos; pessoas acorriam para participar do butim; outros se afastavam com pilhas de vestuário nos braços. Era um alvoroço alegre, uma ocasião feliz, uma festa e um mercado, tudo ao mesmo tempo.

(Mark Mazower, “O Império de Hitler”, Ed. Companhia das Letras, 2013, págs. 396/397)

Execução do general-ditador Ion Antonescu



sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Mirmídones



O alemão Thomas Mann (1875-1955, Prêmio Nobel de Literatura de 1929, filho de mãe brasileira, caso você não saiba) escreveu aquele que eu humildemente considero o melhor livro que li na vida, “A Montanha Mágica”, que — de tão bom — me inspirou a aprender alemão para lê-lo no original (“Der Zauberberg", 1924).

Thomas Mann foi um dos maiores opositores de Hitler, tendo se exilado na Suíça já em 1933 e emigrado para os Estados Unidos em 1938, de onde promoveu — sob o patrocínio da BBC de Londres — as transmissões radiofônicas contra o regime nazista de 1940 a 1945.

Essas mensagens foram reunidas no livro “Ouvintes Alemães” ("Deutsche Hörer", Ed. Zahar, 2009, também encontrado como "Discursos contra Hitler"), de onde se extrai o seguinte trecho de fevereiro de 1941 (págs. 30/31), que comenta o discurso de Hitler no Sportspalast de Berlim no dia 30 de janeiro de 1941, repleto de anedotas infames:

Insuperável. Essa e outras preciosidades humorísticas que geraram gritos de alegria no Palácio de Esportes repleto de mirmídones passarão de um século a outro – a não ser que o pudor humano o impeça. Pois não há, de fato, algo que ofende insuportavelmente o pudor, algo de idiotamente obsceno, em ser tão engraçado diante das condições do mundo atual, condições pelas quais o senhor Hitler deve se sentir responsável? Deveras, esse é o momento oportuno para se fazer piadas idiotas! Calamidades e angústias, caçadas humanas, expatriações, desespero e suicídio, sangue e lágrimas enchem a Terra. Nações orgulhosas de suas histórias, nações às quais a humanidade muito deve e que viviam em bem-estar, encontram-se despedaçadas, violentadas, pilhadas. Outras conduzem uma batalha de vida ou morte para impedir tal destino. Outras ainda se veem obrigadas a sacrificar suas liberdades à liberdade e empregar todos os seus recursos na preparação para a batalha. O próprio povo alemão, que há oito anos vive em guerra e em péssimas condições, em meio a um continente destroçado, ameaçado pela fome e pelas epidemias, olha com um horror secreto para um futuro que lhe promete apenas guerra, uma guerra após a outra, uma guerra interminável, uma privação interminável e ao mesmo tempo o ódio e a maldição do mundo. Seu líder, no entanto, faz gracejos com isso.
Essa foi uma das razões pelas quais o discurso causou uma impressão tão abominável aqui. Outra coisa que causa má impressão, e há muito tempo, é a vaidade infantil desse homem que o faz dizer “eu” sem parar e sem se dar conta de que essa ênfase na primeira pessoa, exatamente no caso de sua pessoa, é uma insuportável falta de gosto e de tato, tanto estética quanto moral. Pois é intolerável que alguém em cuja pele ninguém gostaria de estar diga constantemente “eu”.

Thomas Mann chama de “mirmídones” os espectadores do discurso do Führer naquele dia de infâmia no Sportspalast de Berlim.

Segundo a Wikipedia, “os mirmidões ou mirmídones foram um dos lendários povos tessálicos que acompanharam Aquiles à Guerra de Troia. O nome deles deriva do grego myrmex que significa formiga”.

Os dicionários de português traduzem mirmídones como “homúnculos” ou “lacaios servis”.

Enfim, tudo muito atual.

Nada de novo no front!






segunda-feira, 28 de março de 2022

"O Show de Truman" e o direito de mudar de vida



Mantenho há décadas o saudável hábito de rever os meus filmes favoritos, aqueles (clássicos ou não) que — de alguma forma — ajudaram a construir o ser humano que eu sou.

Afinal, os bons filmes costumam resistir ao tédio e à monotonia e se revelar (assim como os seus segredos) após esta sucessão de, digamos, agradáveis "releituras".

Dentro desta pequena lista está "O Show de Truman" ("The Truman Show", 1998), que foi aos poucos se enveredando na minha "top ten movies of all time list" e hoje, muitas vezes visto e revisto, posso concluir — para espanto de muitos (e meu próprio) — que é o melhor filme que vi na minha vida, sim, senhoras e senhores, cheguei ao número 1.

Alerta: o texto a seguir contém spoilers (não tão relevantes) do filme "O Show de Truman".

Pouparei os leitores de maiores detalhes (o filme fala por si só) mas queria registrar apenas um ponto focal que reparei na última vez que o assisti alguns dias atrás e que reproduz uma lição que aprendi e apliquei na minha própria vida (desde os anos 1980's do milênio passado) e que comentei a várias pessoas que me procuraram em busca de um conselho que as fizesse enfrentar um problema que as afligia e mudar de vida (para melhor, obviamente).

Assim como na minha vida e na vida de tantas outras pessoas, na ficção de Truman as mudanças definitivas só ocorrem quando ele (o personagem brilhantemente vivido por Jim Carrey) decide alterar radicalmente a sua rotina e — a partir de então — começa a fazer as mínimas coisas de maneira paulatina e/ou completamente diferente.

Sim, creia-me: pequenas mudanças no seu cotidiano, aparentemente imperceptíveis, têm um poder enorme de trazer benefícios perenes.

Parêntesis para o proposital nome do personagem central do filme em questão: Truman Burbank

"True man" em inglês significa "homem verdadeiro" e Burbank é a cidade californiana localizada na área metropolitana de Los Angeles (a cujo Condado pertence) onde estão localizados os estúdios de boa parte das redes americanas de TV e dos grandes produtores de cinema, aí incluída a Disney.

Voltando: no momento em que Truman Burbank percebe que a sua vida é uma rotina mal ensaiada (e mal televisada, apesar da repetição constante), é que ele se permite ter o insight de que mudanças são necessárias, vitais e urgentes, por mínimas que pareçam naquele instante.

A partir daí ele começa a se libertar da sua prisão mental e social, constatando que — até então — havia sido refém de uma gaiola montada artificialmente para o prazer mórbido (por que não dizer... fetiche?) dos outros e que está nele, apesar de todas as intempéries (lembrem-se da tempestade final), o poder de simplesmente dizer não!

Não por acaso, na cena final Truman repete o bordão com o qual ele começa o seu dia todos os dias respondendo ao "bom dia" dos vizinhos (iniciando a rotina maçante diária do que os outros esperam dele): "in case i don't see ya, good afternoon, good evening and good night!" (algo que poderia ser traduzido bem livremente naquele contexto como sendo: "caso eu não veja vocês, um belo dia de trabalho, bom regresso à casa e bons sonhos à noite!").

Entediante, não é mesmo?

Melhor não!

Convenhamos: o show da vida pode (e deve) ser bem melhor!









segunda-feira, 24 de maio de 2021

"Fake news" nos tempos de Jesus


Em tempos bicudos (des)governados por "fake news", não deixa de ser curioso verificar que não há nada de novo no fenômeno da mentira como instrumento do exercício do poder.

No relato da ressurreição de Jesus Cristo segundo Mateus, capítulo 28, quando se torna claro como a luz do sol, para as autoridades políticas e religiosas de plantão, que o túmulo está vazio e não há explicação lógica para isto, uma ideia das trevas lhes vem à cabeça.

Por que não criar uma versão alternativa que justifique o túmulo vazio?

As coisas aconteceram rápido naquela manhã de domingo em Jerusalém.

Quando o poder acordou, já era tarde demais.

Até o versículo 11 de Mateus 28, o cenário da ressurreição já está consumado: mulheres em busca do Cristo, terremoto, anjo, pedra da entrada movida, guardas em desespero, Jesus aparece às mulheres e lhes dá uma nova missão, o convite para um encontro na Galileia, e somente aí os soldados da guarda - despertos do choque - correm para contar o ocorrido às autoridades religiosas.

O pânico se instaura nos altos círculos do poder religioso, e antes que o poder político pudesse imaginar, são essas autoridades que, nos versículos seguintes, tramam o plano com os soldados, urdindo as "fake news" de que se estes perguntados fossem por seus superiores, diriam que o corpo fora roubado pelos discípulos durante a noite.

Algo precisava ser feito urgentemente, para que o poder não se lhes escapasse, nem que fosse mentiroso, paliativo e temporário.

Como deixa claro o ditado popular, "a mentira tem perna curta", e as "fake news" servem para um propósito imediato com prazo de validade. Mais cedo, ou mais tarde - inevitavelmente - a verdade prevalecerá.

É triste ver como muitos líderes religiosos, hoje em dia, não aprenderam a lição.

Talvez lhes tenha escapado o versículo 11 do Salmo 63: "as bocas dos mentirosos serão lacradas" (versão King James Atualizada em português).

Ainda nesta versão bíblica, "prestei atenção e ouvi; contudo, eles não falam o que é verdadeiro.  Ninguém deseja se arrepender de sua impiedade e ainda alegam: 'O que foi que eu fiz?' Cada um se desvia e segue seu próprio e costumeiro caminho, como um cavalo que se lança no ímpeto da batalha" (Jeremias 8:6).

Voltando àquela manhã da ressurreição, ninguém sabe dizer realmente o que ocorreu com os guardas e as autoridades religiosas e políticas depois de constatarem a tumba vazia, a não ser que - de uma forma ou outra - foram atropelados não por cavalos mas pela realidade que quiseram falsear.

Terminaram lacrados.

O fato é que mundo nunca mais foi o mesmo a partir de então.



quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Quando a tentação é ser bom

Vivemos tempos tão assustadoramente perversos, em que a maldade impera, que é inevitável lembrar de Hannah Arendt, filósofa alemã de origem judia, que soube como poucos interpretar o que acontecia à sua volta no século passado.


Em seu livro "Eichmann em Jerusalém" (Companhia das Letras, 1999), ela consegue captar as nuances que (de)formaram o caráter da população alemã no período do Terceiro Reich, e resume de maneira brilhante a situação do "homem médio" nazista diante da possibilidade de cometer um ato que ele - de antemão - sabia ser criminoso (de acordo com a lei ou o direito natural ou sua consciência) e pecaminoso (de acordo com a religião que professava):

E assim como a lei de países civilizados pressupõe que a voz da consciência de todo mundo dita "Não matarás", mesmo que o desejo e os pendores do homem natural sejam às vezes assassinos, assim a lei da terra de Hitler ditava à consciência de todos: "Matarás", embora os organizadores dos massacres soubessem muito bem que o assassinato era contra os desejos e os pendores normais da maioria das pessoas. No Terceiro Reich, o Mal perdera a qualidade pela qual a maior parte das pessoas o reconhecem - a qualidade da tentação. Muitos alemães e muitos nazistas, provavelmente a esmagadora maioria deles, deve ter sido tentada a não matar, a não roubar, a não deixar seus vizinhos partirem para a destruição (pois eles sabiam que os judeus estavam sendo transportados para a destruição, é claro, embora muitos possam não ter sabido dos detalhes terríveis), e a não se tornarem cúmplices de todos esses crimes tirando proveito deles. Mas Deus sabe como eles tinham aprendido a resistir à tentação.
(p. 167)

Na deturpada visão de mundo da nação alemã na década de 1930, sentir que deveria fazer o que era bom e correto não passava de uma tentação a ser evitada a todo custo, e o resultado disso, quando não era traduzido em atos monstruosos de aniquilação dos diferentes, foi uma gigantesca omissão coletiva que ajudou a matar milhões de pessoas. 

Nada muito diferente do que vivemos hoje em dia, à nossa volta, com pessoas que julgávamos "boas", pois como lembra também C. S. Lewis, "a maldade não passa de bondade corrompida".



terça-feira, 8 de setembro de 2020

Testemunho de verdade


Pedindo desculpas por retomar o trágico e grotesco "espetáculo" do caso Flordelis, o fato é que aquela aberração continua rendendo manchetes vergonhosas que têm causado muita revolta em denominações que se julgam "perseguidas" após se considerarem atingidas - ainda que marginalmente (com o perdão do péssimo trocadilho) - pelo mar de lama que avançou impiedosamente sobre os arraiais evangélicos. 

Sempre há algo de bom, entretanto, que se pode extrair de tanta imundície. 

Nesta enxurrada insalubre e interminável de notícias bizarras, o Estadão traz duas matérias que revelam detalhes, com o perdão da palavra, particularmente "nojentos" do ocorrido: 



Muita gente certamente quer fugir dessas notícias como o diabo da cruz, mas seria bastante, digamos, "pedagógico" se tapassem os narizes e lessem pelo menos essas duas matérias na sua íntegra e aproveitassem para fazer uma humilde reflexão. 

Constatariam, por exemplo, que o relatório da investigação policial inclui o seguinte trecho: 

      “(A testemunha) narra episódio em que sua ex-supervisora, em meados de 2007, ao aceitar o convite feito pela declarante e visitar a igreja de Flordelis, reconheceu a pastora como sendo frequentadora da mesma casa de swing que ela frequentava”. “Complementando, inclusive, que a então pastora tinha um quarto exclusivo ali.” 


"Quarto exclusivo"... numa casa de swing...

Sim, é isto mesmo o que você leu, o relato consta de um documento oficial do inquérito policial que serviu de base para a decretação judicial da prisão preventiva de vários filhos do (até então) poderoso casal gospel

Obviamente, este não é o único detalhe sórdido do inquérito, e juntamente com os demais indícios colhidos na investigação, tudo - absolutamente tudo - deverá passar pelo crivo do devido processo legal e do contraditório para restar confirmado (ou não), mas podemos - pelo menos - colher algumas ideias iniciais e bastante abrangentes sobre como se percebe, publicamente, a conduta de muitos líderes evangélicos do país. 

"A imagem é tudo!" resume a sua estratégia mundana de dominação.

Hoje, basta alguém se apresentar como "portador" de uma revelação particular de Deus, que muita gente sequer questionará de onde vem aquele autodenominado "profeta", ou quais são as suas motivações, ainda mais se sua oratória incluir aquela pregação ofegante que, não se sabe desde quando, virou sinônimo de "inspiração divina". 

O simples fato de usar sofregamente o nome de Deus (em vão) dá a esta pessoa subitamente transformada em "emissário" o condão de ser imediatamente respeitado como uma voz autorizada a falar em nome do Divino. 

Ai de quem se recusar a ouvi-los...

Por isso, muitos incautos abrem as suas portas e os recebem como enviados sagrados, sem ao menos pedir ao Senhor que testifique pelo Seu Espírito sobre a idoneidade daquelas pessoas.

João, o apóstolo, evangelista, missivista e profeta, insiste muito no testemunho do Espírito Santo a respeito da segurança e da certeza que Deus dá a respeito das coisas sagradas e do discurso feito em Seu nome: 

João 3:32  E aquilo que ele viu e ouviu, isso testifica; e ninguém aceita o seu testemunho.
João 5:32  Há outro que testifica de mim, e sei que o testemunho que ele dá de mim é verdadeiro.
João 8:18  Eu sou o que testifico de mim mesmo, e de mim testifica também o Pai, que me enviou.
João 21:24  Este é o discípulo que testifica dessas coisas e as escreveu; e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro.
1ª João 5:6  Este é aquele que veio por água e sangue, isto é, Jesus Cristo; não só por água, mas por água e por sangue. E o Espírito é o que testifica, porque o Espírito é a verdade.
Apocalipse 22:20  Aquele que testifica estas coisas diz: Certamente, cedo venho. Amém! Ora, vem, Senhor Jesus! 

Por sua vez, os crentes atuais não têm nenhuma preocupação com o testemunho pessoal e do Espírito Santo, pois (talvez por não conhecê-LO) aceitam como verdadeiro - e sem questionamento - o discurso religioso venha de quem vier, desde que use o nome de Deus como uma espécie de "senha" para que o seu suposto mensageiro seja "temido", "reverenciado" e tido por "divinamente inspirado". 

Depois fingem surpresa quando os escândalos acontecem. 

Simplesmente fingem que não é com eles...

Se - ao invés de se deixarem seduzir pelo primeiro canto de sereia que ouvissem - lessem a Bíblia, estariam minimamente familiarizados com a carta de Judas, que alerta sobre os ímpios que se infiltram dissimuladamente no meio da igreja, transformando a graça de Deus em libertinagem (v. 4), esses sonhadores que contaminam os próprios corpos e rejeitam as autoridades (v. 8), animais irracionais que difamam tudo o que não entendem (v. 10), buscando o lucro (v. 11), nuvens sem água, pastores que cuidam só de si mesmos, árvores sem frutos, duas vezes mortas (v. 12), espumando os seus próprios atos vergonhosos (v. 13) e seguindo os próprios desejos impuros (vv. 16 e 18).

"Estes são os que causam divisões entre vocês, os quais seguem a tendência da sua própria alma, e não têm o Espírito!" (Judas v. 19).



quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Escandalosa hipocrisia



A acusação que pesa sobre a deputada (PSD-RJ) e pop star gospel Flordelis (clique aqui para ler a matéria do El País), a se confirmar (garantindo-lhe a plena defesa), é uma réstia de luz que permite enxergar os fétidos intestinos do que se transformou parte muito expressiva do evangelicalismo no ex-Brasil. 

São tantos dados pirotécnicos sobre uma suposta "espiritualidade" que preferimos nos concentrar na frase que a deputada teria dito: “Fazer o quê? Separar dele não posso, porque senão ia escandalizar o nome de Deus". 

Considerando-se que esta informação foi dada por Promotor de Justiça que cuida do processo, é muito provável que a afirmação seja verdadeira. 

Também são inúmeros os ângulos pelos quais se pode tentar analisar a questão.

Entretanto, "o que eles fazem em oculto, o só referir é vergonha" (Efésios 5:12).

Por isso preferimos nos concentrarmos na frase acima transcrita, porque ela revela que - para este segmento muito popular do evangelicalismo brasileiro - a imagem vale muito mais do que a palavra. 

Se já não bastasse a releitura prática que eles fizeram de Mateus 6:33, que na versão deles diz "buscai, pois, em primeiro lugar, o poder político e o governo, e todas estas coisas vos serão acrescentadas", na verdade estão muito mais preocupados com o que os outros vão falar... 

Neste mundinho em que muita gente diz "sentir no coração" um "chamado" e imediatamente funda uma "igreja" na garagem de casa, imagem e popularidade são valores absolutos e inegociáveis. 

Por mais que prezem a imagem de "defensores da vida e da família" nas suas pregações ideológicas de ocasião, na prática vida e família são valores secundários, que podem ser cinicamente negociados e facilmente descartados quando surge a ameaça de "escândalo". 

Nas suas "revelações" particulares em terra de mais caciques do que índios, só existe espaço para o narcisismo travestido de "espiritualidade" e ai de quem ameaçar a imagem de piedade tão duramente fabricada... 

Bíblia e religiosidade são meros instrumentos que essa gente usa a seu bel prazer.

E ninguém lhes confronta, porque amanhã, quem sabe, eles poderão fundar a sua própria "igreja" e dela se beneficiarem.

Melhor se calar (por enquanto).

O "nome de Deus" é - lamentavelmente - mero joguete, uma espécie de "coringa" ao qual se recorre conforme a situação aperta.

Felizmente, "nada há oculto, que não haja de manifestar-se, nem escondido, que não venha a ser conhecido e revelado" (Lucas 8:17, 12:2; Mateus 10:26, Marcos 4:22).

Detalhes sórdidos à parte, a dura verdade é que, em muitos arraiais "evanjélicos", hoje impera uma versão macabra de hedonismo com alto poder... de implosão. 



terça-feira, 9 de junho de 2020

Black Lives Matter



Apesar de sermos do mesmo sangue dos nossos compatriotas e dos nossos filhos serem tão bons quanto os deles, ainda assim temos que sujeitar os nossos filhos e as nossas filhas à escravidão. E, de fato, algumas de nossas filhas já foram entregues como escravas e não podemos fazer nada, pois as nossas terras e as nossas vinhas pertencem a outros". 

Quando ouvi a reclamação e essas acusações, fiquei furioso. 

Neemias 5:5,6 - NVI


Percebo que há muitos crentes que se contentam em viver num mundo em que estão confortáveis com as suas vidas, não os incomodando o contexto social em que vivem, e muito menos têm ouvidos alertas para quem grita por socorro.

Ora, a salvação do Senhor em Cristo Jesus não nos foi graciosamente dada apenas para nos sentirmos bem conosco mesmos, mas também (e principalmente) para servir aos que dela carecem, independentemente de que a aceitem ou não.

"Assim também a fé, por si só, se não for acompanhada de obras, está morta" (Tiago 2:17) 

Se outras vidas não lhe importam, talvez você não tenha entendido (ou, pior, não recebeu no seu mais íntimo) o evangelho da cruz de Cristo. 

O maior entre vocês deverá ser servo. (Mateus 23:11)

Então o Senhor perguntou a Caim: "Onde está seu irmão Abel? " Respondeu ele: "Não sei; sou eu o responsável por meu irmão? (Gênesis 4:9) 

Sim, eu sou, você é, todos nós somos responsáveis!

quinta-feira, 14 de maio de 2020

Reflexões pandêmicas - 06


Houve um tempo em que os "evanjélicos" elaboravam discursos pomposos combatendo a descriminalização do aborto alegando razões éticas que, para eles, barravam qualquer discussão racional e/ou filosófica sobre o tema.

O tempo passou, algumas denominações se tornaram "puxadinhos" de partidos políticos, muitas igrejas se transformaram em verdadeiros comitês eleitorais com seus "rebanhos" cativos, "pastores" se converteram em animadores de comício, e tudo mudou.

Hoje, esses mesmos "evanjélicos" aceitam gozosamente ideias demoníacas como a eugenia e a eutanásia, tudo para defender os "mitos" e "falsos cristos" que colocaram no poder.

E o fazem com fanatismo perverso.

Para justificar a loucura, buscam no utilitarismo as razões filosóficas para apoiar a sua depravação.

Agora, quem diria, os fins justificam os meios.